Sobre o Medo de Amar




Escrevi em um post no facebook que o amor é ônus que a nossa geração, medrosa e frouxa, reage com desprezo. E que esta reação é sintomática, pois revela o que a gente vive tentando esconder: o medo de amar. Ao fazê-lo, eu tinha em mente as notícias correntes sobre homens japoneses que têm preferido bonecas de cera à mulheres. E também das novas configurações de relacionamento familiar  denominadas de “coparentalidade” ¹; onde gerar um filho é objeto de suprimento da carência afetiva de adultos, pouco importando os desajustes que estes “filhos da projeção carente” venham sofrer num mundo muito bagunçado onde o medo de amar de seus pais são uvas verdes que embotaram os seus dentinhos de leite.

Estamos acostumados como antagonistas do amor os parceiros egoísmo e orgulho. Estes dois sentimentos tão íntimos e indissociáveis à nossa humanidade, parecem ser os fantasmas assombradores da caridade— uma espécie de “espíritos zombeteiros”, como dizem os espíritas kardecistas. Outra linha os chamariam de encosto mesmo.

A verdade é que o amor sobrevive ao orgulho e ao egoísmo. Todavia, ele não subsiste a resistência que se tenha acerca de si mesmo. Em outras palavras: o medo de amar é aniquilação do amor. É a sua erradicação no sentido de se vacinar contra a epidemia de frustração. Só o medo é capaz de extirpar a experiência da vida não-vivida e de prolongar a vida-vivida por causa da frustração. O medo lança fora o amor, não é isto que Pedro, o apóstolo, diz ao contrário?

Possivelmente alguém que tenha se frustrado no amor dirá que não seria o caso, já que se lambuzou até demais, e o resultado é a lambança em que sua vida amorosa se encontra. Ora, somente quem se “lambuza” é capaz de amar. É assim que o Divino faz ao encarnar a lambança da existência humana em Cristo: o Jesus. É este o ônus que o amor impõe a quem ama.

Mas voltando aos sintomas que nossa reação ao ônus do amor denuncia, é que acredito que o conceito de Modernidade Líquida do sociólogo e filósofo Zygmunt Bauman (1925-2017)² deu boas palavras a uma observação socioantropológica dos homens e mulheres de nosso tempo (e aqui importa apenas a clareza que a definição central de Bauman nos dá): o medo de amar faz a passagem do estado sólido de nossa capacidade de amar para o estado liquefeito da nossa frouxidão.

Entre a capacidade de amar e o medo de amar, está a ponte da experiência. Da lambança lá de trás.  A propósito, nunca atravessaremos esta ponte sem a possibilidade da queda. Sem o ônus do risco e o acidente da ruptura.

O medo de amar, entretanto, nos levará à escolhas, as mais artificiais possíveis. Nem sempre bonecos ou bonecas de cera como preferência; mas a inevitável virtualidade afirmada sobre a realidade. O orgulho e o egoísmo são elementos repressores do amor e, cedo ou tarde, eles voltam à sua assombração. O medo de amar, porém, é aniquilador. Ele lança fora o amor, nas palavras do apóstolo.

As consequências do medo de amar são as mais desastrosas para o indivíduo e para a civilização. No primeiro caso, ele se dissolve do seu ser pleno. No segundo, ela se dissolve de sua capacidade de produzir valores para às futuras gerações.


Você quer um ato de resistência a bem da humanidade? Ame!


Por Fernando Lima.



¹ Para melhor compreensão, confira esta reportagem exibida pelo Fantástico (http://g1.globo.com/fantastico/noticia/2017/07/fantastico-explica-coparentalidade-uma-nova-forma-de-familia.html) sobre pessoas que decidem ter um filho sem que seja pelos vínculos paterno-maternal sobre os quais – vínculos- defendo que tenham evitado a derrocada das civilizações, com razoável saúde. Claro, até aparecer alguém com uma teoria social que diga que filhos híbridos de androides com animais é um tabu a ser quebrado.

² Outros disseram isto de outras formas. Além de Jesus, acho sugestivo conhecer o que disse Ovidio Publius em Arte de Amar e Caio Fábio em O Poder de Simplesmente Dizer ‘ Ta doendo’.






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